quarta-feira, 9 de junho de 2021

"Por uma arte verdadeira e livre", evento sobre o manifesto de Trotsky e Breton

Extraído do site do Partido Obrero da Argentina 

Com companheiros e companheiras do Brasil e da Argentina



                                                                                           Por Roberto Rutigliano do Rio de Janeiro


No dia 5 de junho, sábado, várias personalidades da arte e da filosofia se reuniram virtualmente no Brasil para apresentar suas impressões sobre as questões levantadas no Manifesto "Por uma arte independente e revolucionária", de 1938, escrito por León Trotsky e André Breton.

O evento contou com a presença do cineasta argentino Alejandro Rath, diretor do filme “Manifiesto”. Pelo grupo Tribuna Classista participou Luís Guilherme Tarragô Giordano, que falou sobre Arte e política. Também estiveram presentes os professores de filosofia Pedro Hussak e Martha D'angelo, que falaram de Benjamin Perét e Mário Pedrosa, duas figuras importantes do núcleo de origem do trotskismo no Brasil. E pela corrente Política Revolucionária, participaram a professora e artista plástica Paloma Carvalho Santos e o músico Roberto Rutigliano, que falaram sobre os desdobramentos que existiram no Brasil desde a publicação do Manifesto. O evento foi intitulado "Por uma arte verdadeira e livre",

A questão da liberdade artística foi abordada em oposição ao conceito stalinista de “realismo socialista”. A ideia de Trotsky era que, após a experiência autoritária do stalinismo, teríamos que repensar o papel do Estado em relação ao fazer arte. O Estado não podia impor aos artistas nenhum tipo de orientação estética; o Manifesto afirma que dificilmente os artistas teriam que se guiar por sua própria verdade ao se expressar.

A ideia central do evento foi mostrar a relevância do Manifesto e refletir sobre vários aspectos. Ale Rath comentou, entre outras questões, como em uma sociedade capitalista, a maioria das pessoas tem que dedicar seu tempo apenas à sobrevivência; por outro lado, em uma sociedade sem classes, seriam criadas as condições para que os trabalhadores pudessem se dedicar às atividades artísticas e haveria muito mais projetos criativos.

Roberto Rutigliano falou pela prim


Roberto Rutigliano falou primeiro sobre a estigmatização que existe na figura de Trotsky; em seguida, ele descreveu a atividade do poeta André Breton. Ele comentou que este último entendeu que além de fazer arte, ele teria que mudar o mundo, porque a arte no mundo capitalista é entendida como uma mercadoria. Ele também lembrou de um comentário que Breton fez ao cineasta Luis Buñuel: “Hoje ninguém se escandaliza, a sociedade encontrou meios de anular o potencial provocador de uma obra de arte, adotando uma atitude de prazer consumista diante dela”.

Luís Guilherme Tarragô Giordano deu exemplos de como durante os governos do PT, a proximidade do lulismo com o agronegócio e com os latifundiários permitiu a valorização de um gênero musical vulgar como o “sertanejo comercial”, impondo esse tipo de estética às massas, banalizando a arte e escondendo os verdadeiros valores da arte brasileira.

Pedro Husak falou basicamente sobre seu trabalho acadêmico dedicado a estudar a vida de Benjamin Perét, um poeta surrealista francês amigo de Breton, que morou no Brasil e ajudou a criar um dos primeiros grupos trotskistas em 1930 junto com Mario Pedrosa, conhecido como La Internationalist Liga Comunista.

Ouvimos como curiosidade que neste primeiro grupo trotskista no Brasil, por causa da relação de Perét com a cultura afro-brasileira, Trotsky era referido como Ogum (uma divindade do Candomblé que representa o guerreiro), também associado a São Jorge (Ogum dentro do Paralelo cristão), isto a partir da imagem histórica de Trotsky em um cavalo com uma lança.

Perét escreveu dois livros dedicados à luta das comunidades negras; Ele esteve preso no Brasil, lutou na Espanha na guerra civil ... enfim, uma vida emocionante ligada à arte e à ação política.

Pedro também nos descreveu como Peret desenvolve um estudo de mitos e como a introdução deste livro tem um grande impacto no manifesto da FIARI (Federação Internacional da Arte Revolucionária e Independente), no sentido de entender o mito como o principal elemento de fundação de um conceito de poética e poesia como expressão de liberdade. Breton afirmaria que essa concepção poderia ser considerada um terceiro manifesto surrealista.

Martha D'Angelo, professora de filosofia, autora do livro "Educação Estética e Crítica da Arte na Obra de Mário Pedrosa", falou-nos sobre como esse autor ajuda a publicar o Manifesto no Brasil em 1946, bem como sua atuação na fundação da Quarta Internacional e na publicação “Vanguarda Socialista”, juntamente com Edmundo Moniz.

Martha falou sobre o potencial da cultura para mudanças no mundo. Ela contou como o projeto capitalista via a cultura apenas como algo decorativo e como a partir de 2017 há um foco para atacar a cultura no Brasil e criminalizar a política.

Martha também comentou que Pedrosa não vê a arte desconectada de um projeto político. Ela refletiu que o socialismo é pensado apenas a partir da questão material da socialização dos meios de produção, mas seria necessário aspirar a uma vida mais plena do ponto de vista da condição humana.

Paloma Carvalho Santos, por sua vez, falou de Pedrosa como crítico e militante. Ela mencionou que Pedrosa foi um mentor da arte “neoconcreta” no Brasil, apoiando a produção artística de Lygia Clark (na foto, uma de suas obras) e Hélio Oiticica, superando a ideia de obra de arte associada à venda de objetos que podem se tornar patrimônio de coleções dentro de um ambiente burguês.

A ideia libertadora de Pedrosa seria a negação do objeto como valor de troca, mantendo a liberdade criativa, entendendo a arte como uma arte próxima à vida nas ruas, nas performances e nas paredes e não na sua apropriação como bem de consumo.

A atividade que realizamos não é algo fechado; pelo contrário, a ideia é que se desdobra em discussões, que desperte curiosidade e atenção para muitas questões que foram levantadas entre os palestrantes. O próprio ato estimulou, por exemplo, o interesse em ver o filme de Rath, conhecer a vida de Perét e Pedrosa e nos ajudou a refletir sobre o estado atual do Manifesto.

Continuaremos no dia 19 nas ruas contra o Bolsonaro e no dia 26 com um novo ato dedicado à questão do desemprego no Brasil.