sexta-feira, 10 de março de 2023

Brasil: o PT na contenção das massas diante da ofensiva direitista

 Extraído e traduzido do link: 

https://revistaedm.com/edm-23-3-05/brasil-el-pt-en-la-contencion-de-las-masas-frente-a-la-ofensiva-derechista/



                                                                                                                                   Por Rafael Santos

Há dois meses da ascensão de Lula

Dois meses após a posse do governo Lula, confirma-se claramente sua trajetória de conciliação aberta com a direita (incluindo o bolsonarismo) e o grande capital, e de subordinação e adiamento das demandas populares à necessidade de "estabilidade" do governo. 


Bolsonaro atacava, Lula continha

Lula apareceu como o recurso preventivo utilizado pelo imperialismo e pela maioria dos capitalistas nativos para tentar impedir que o Brasil ingressasse na onda de rebeliões populares que vem varrendo a América Latina contra os planos de ajuste do fundo monetário e o descarregamento da crise capitalista mundial sobre as massas.

 Recurso que foi utilizado durante todo o período em que o PT de Lula esteve na “oposição” ao governo Bolsonaro, permitindo-lhe avançar com ataques históricos às massas (uma política criminosa de saúde diante da pandemia de COVID, reformas trabalhista e previdenciária, etc.), contendo e desorganizando ao máximo as lutas populares. Para isso, valeram-se do domínio de Lula - através das burocracias - sobre importantes organizações de massa (trabalhadores, camponeses, sindicatos estudantis, etc.).

 É por isso que o governo fascistóide de Bolsonaro não atacou ou baniu (embora tenha enfraquecido) as organizações operárias e de massas lideradas pelas burocracias. Ele "precisava" deles para desempenhar esse papel de contenção.

 A maior parte da burguesia decidiu “trocar de cavalo” diante da ameaça de uma irrupção popular diante da crise social, alimentada pelas provocações bolsonaristas.

 Lula havia prometido não reverter a centralidade dos avanços reacionários, para isso desenvolveu uma política de "frente popular" de conciliação de classes constituindo uma Frente Ampla da Esperança com setores proeminentes da direita neoliberal (Alckmin como vice-presidente, Tebet como ministro Planejamento, etc.).


 Acobertamento dos responsáveis ​​pela aventura de Bolsonaro em 8 de janeiro

O triunfo eleitoral presidencial de Lula (ainda que por margem estreita e sem maioria parlamentar) foi respondido pelo bolsonarismo com uma série de provocações. Elas foram desenvolvidas nos dois meses anteriores à posse de Lula (bloqueio de estradas, acampamentos em frente aos quartéis propondo intervenção direta das Forças Armadas, atentado terrorista etc.). E culminou no domingo, 8 de janeiro, com uma marcha até a Praça dos Três Poderes, na capital, Brasília. Já analisamos em notas anteriores (prensaobrera.com) o desenvolvimento desta jornada semi-golpe. Uma mobilização de Bolsonaro que partiu dos acampamentos em frente aos quartéis, ocupou as sedes dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, exigindo seu desconhecimento e substituição direta pelos militares.

 Embora não tenham intervindo diretamente, deixaram passar, colaborando com a mobilização fascista. Impuseram uma “zona liberada” na Esplanada, não colocando e retirando forças de segurança, apesar do conhecimento prévio desta marcha-motim.

 Impediram inclusive que os que voltassem aos acampamentos em frente ao quartel fossem detidos até o dia seguinte, permitindo assim que militares e familiares saíssem para não serem acusados.

A resposta de Lula foi a conciliação com o alto comando militar. Primeiro, aceitou a substituição do comando-chefe do Exército "eleito" por seus pares antes da posse de Lula, em 1º de janeiro, prometeu investigar e punir os que cometeram negligência, mas quase imediatamente nomeou o coronel Mauro Cesar Barbosa Cid, fiel executor militar dos mandatos do ex-presidente Bolsonaro, para um comando decisivo na segurança do Planalto. Diante dessa situação, Lula foi obrigado a demitir o Comandante General Júlio César de Arruda, colocando em seu lugar o General Tomás Ribeiro Paiva que teve o "mérito" de ter declarado publicamente que o resultado eleitoral tinha que ser respeitado. Mas sua trajetória mostra uma longa trajetória de direita (de funcionário do presidente neoliberal Fernando Henrique Cardozo, a um dos oficiais que participaram ativamente da operação militar no Haiti - fonte de 90% dos dirigentes golpistas bolsonaristas orientados por Villas Boas-, signatário do comunicado que decidiu pela exoneração da presidente do PT, Dilma Rousseff, etc., etc.). Lula chegou a um acordo de que o alto comando militar faria sua própria investigação sobre os comandantes envolvidos no golpe de 8 de janeiro para seu eventual julgamento. Para isso, Paiva colocou em funcionamento o "Ministério Público Militar", formado por militares. Claro que as “investigações” irão se prolongar por muito tempo e vão tentar salvar os mais importantes comandantes militares envolvidos, sancionando alguns “peixinhos pequenos”. É claramente uma “seleção” gatopardista: mudar alguma coisa, para que todos os controles continuem mais ou menos nas mãos dos envolvidos ativamente com o bolsonarismo.

O ministro da Defesa de Lula, José Múcio, tomou posse como parte de um acordo imposto pelas Forças Armadas com o governo Lula.

 As propostas de Lula para avançar na democratização das Forças Armadas ficam apenas em promessas de reformas cosméticas (mudança dos planos de formação dos institutos militares de ensino, eliminação da pauta da comemoração do golpe de 1964 que Bolsonaro impôs, etc.). Deputados do PT apresentaram ao Parlamento projetos para eliminar o "direito constitucional" para que qualquer um dos três poderes do Estado exija unilateralmente uma intervenção militar para restaurar a "ordem". Mas, no Parlamento, a bancada de Bolsonaro e seus aliados de direita têm maioria, o que dificulta sua aprovação. Não será uma "norma legislativa" que impediria o eventual desenvolvimento de um golpe ocasionalmente convocado pela classe dominante. A “interpretação” da lei é então adaptada ao golpe bem-sucedido.

Lula quer se reconciliar com os generais. Em recentes reuniões com os mesmos, prometeu investir 9 bilhões de reais em recursos para a “Defesa” (equipamentos, desenvolvimento de indústrias militares, etc.).

Haverá inevitavelmente uma crise, mas a "operação de impunidade" está se desenvolvendo em seus caminhos legais normais. 


Pacto Parlamentar com o Bolsonarismo

O governo do PT apoiou a reeleição de Arthur Lira como presidente da Câmara dos Deputados. Este, como representante do bloco do chamado "Centrão" foi apoiado na liderança da Câmara Federal pelo bolsonarismo. Lira arquivou dezenas de pedidos de impeachment (julgamento político) contra Bolsonaro apresentados nos últimos 4 anos (por sua política criminosa contra a COVID, etc.). Ele foi o promotor do chamado "orçamento secreto" para o uso (corrupto) de deputados para obras públicas em seus distritos. Ele convocou publicamente para votar em Bolsonaro no recente segundo turno das eleições em outubro.

A eleição de Lira foi histórica: ele foi eleito por votação recorde: 464 votos em cerca de 510 deputados, apoiados pelas bancadas do PT e da Frente da Esperança.

Lira tornou-se gradativamente um elemento do poder bonapartista, uma espécie de "presidente" paralelo ao poder executivo de Lula, com um "poder de veto" não institucionalizado.


A crise dos juros

O Banco Central do Brasil acaba de fixar uma taxa de juros de 13,75%: 8% acima da taxa de inflação mais desfavorável anunciada pela própria entidade. Lula saiu para enfrentar essa resolução, propondo a necessidade de reduzi-la para acompanhar as medidas supostamente keynesianas de reativação econômica que o governo quer promover. Mas o Banco Central foi declarado “autárquico” por iniciativa de Bolsonaro, votada pelo Parlamento. E foi colocado no comando deste, Roberto Campos Neto, homem fortemente ligado ao capital financeiro, irremovível até o término de seu mandato em 2024.

Isso se transformou em um grande embate entre o presidente da nação, Lula, e o presidente do Banco Central, Campos Neto. O capital bancário quer manter esse patamar elevado das taxas de juros, para evitar "riscos fiscais" (acentuação do déficit orçamentário, aumento da inflação, etc.). O PT, partido governista de Lula, lançou uma campanha política (“mobilizações” incluídas) para deslocar Campos Neto e/ou colocar o Banco Central em sintonia com os planos econômicos do governo. Isso é para ser usado politicamente e propagandisticamente pelo PT para se apresentar como progressista. É um importante ponto de confronto econômico cujo destino depende se um ou outro setor capitalista se beneficia. O governo Lula quer administrar o capital financeiro, mas...

Gleisi Hoffman, presidente do PT, levantou a necessidade de "a política do Banco Central estar alinhada com o governo". Criticando a resolução "autárquica" de Campos Neto como uma pressão do capital financeiro, Gleisi declarou: "É hora de enfrentar esse discurso 'comerciante' dos ricos desse país, de que temos risco fiscal. Que risco? De não pagar a dívida? Mentira". Comprometendo-se a cumprir rigorosamente o pagamento da dívida pública.

O crédito bancário no Brasil é 85% dominado por apenas 5 grandes bancos. Segundo a CUT, no ano passado a taxa de juros teve um aumento de 11%, o que gerou uma despesa adicional de 410 bilhões de reais. Mas a tentativa de substituir a presidência do Banco Central e domar o "mercado" financeiro está fadada ao fracasso. Já o presidente da Câmara dos Deputados, Lira, saiu propondo que o debate público cesse e que seja discutido nos bastidores, para não prejudicar os “mercados”. Sinalizando sua oposição aberta e da maioria na Câmara à revogação do voto pela autarquia do Banco Central, Lira está exercendo seu direito informal de veto. Lula já deu um passo atrás na pretensão de substituir Campos Neto e anunciou sua disposição de "negociar".

Só a nacionalização do sistema bancário, expropriando os bancos privados e criando um banco único, sob a gestão dos trabalhadores, poderá direcionar o crédito para um real desenvolvimento do país, inclusive favorecendo o consumo popular. Possível em um governo operário e não neste regime de frente popular que pretende defender os interesses do grande capital.


Uma reforma tributária impopular

Uma das medidas mais divulgadas que o governo anunciou é a implementação de uma reforma tributária. Que caráter terá? Vai eliminar os impostos sobre o consumo popular para substituí-los por um imposto progressivo sobre grandes lucros e fortunas?

A direitista ministra do Planejamento e Orçamento (função fundamental que divide com o ministro Haddad da Economia) tem indicado que esta reforma tributária é a "única bala de prata" para resolver "absolutamente os problemas do Brasil", além de ser como a "economia da vacina" de um governo para alcançar o equilíbrio fiscal. A que se refere? Sabe-se que eles pretendem unificar impostos para conseguir "que o Brasil reduza o custo de sua produção, desburocratize, torne o setor produtivo mais competitivo e, com isso, tenha maior produtividade e melhore a economia". Para Tebet, trata-se de "reformular" o déficit fiscal de R$ 230 bilhões, porque cria uma situação "insustentável". Portanto, incorporou muitas variantes de "ajuste". Constatou-se que o imposto de consumo (IVA) será elevado de forma diferenciada - segundo resultados e objetivos - até 25%. Por exemplo, para desencorajar o consumo popular de tabaco e bebidas alcoólicas. O objetivo seria cuidar da "saúde pública" afetando os bolsos dos pobres que não podiam praticar seus vícios menores? Critério de classe que as classes dominantes resolvem confortavelmente.

Por enquanto, a partir de 1º de março, Haddad, ministro da Economia de Lula, reintroduziu parte dos impostos sobre o consumo de gasolina que Bolsonaro havia anulado. Isso, claro, para enfrentar o déficit fiscal (pagamento da dívida pública) em detrimento do ajuste ao bolso popular.

O presidente Lula e seus ministros passam os dias em reuniões e banquetes com as câmaras patronais anunciando seus planos de lucro para o capital. Mas… e a economia dos trabalhadores?


Planos antitrabalhadores

Lula decidiu sacrificar o salário do trabalhador em prol da “estabilidade”. Um aumento do salário mínimo havia sido anunciado em janeiro, mas foi adiado para depois do carnaval, em meados de fevereiro. E a última informação é que seria dado para... "comemorar" o 1º de maio. Segundo a CUT, com base em cálculos de seus economistas, para recuperar o que foi perdido no governo Bolsonaro, o aumento deveria ser de R$ 1.396,00. Mas o governo anunciou que como "transição" vai aumentar o salário mínimo dos atuais 1.302 reais para... 1320 a partir de 1º de maio. Um acréscimo de 18 reais! É uma zombaria e uma provocação lulista ao movimento operário. Como disse um ativista: “apenas o suficiente para duas cervejinhas”. A CUT, sentindo o cheiro dessa desfeita lulista, havia reajustado seu cálculo, rebaixando a reivindicação para 1.382,71 reais. A "promessa" do governo é que um novo regulamento seria formulado em maio para calcular a evolução futura do salário mínimo... a partir de 2024. Qualquer semelhança com as contas dos governos argentinos (macristas ou kirchneristas) não é coincidência. A justificativa é que um aumento maior seria perigoso para as finanças do Estado, que teriam que pagar os aposentados. O que significa que você os está condenando à miséria.

Lula teve como eixo de sua campanha política e eleitoral a proclamação de que veio para combater a fome popular. Mas, de qualquer forma, o faria em detrimento dos salários dos trabalhadores. Estes são planos assistenciais elementares. Na Argentina, o governo Kirchner quer cortá-los devido ao ajuste do fundo monetário. No Brasil, está se expandindo para o que já existia com Bolsonaro, mas com fortes controles. O governo anunciou que 65 bilhões de reais por ano, ou seja, 1,5% do PIB, serão investidos no Bolsa Família. Dez vezes menos que o pagamento de juros da dívida pública (6,5% do PIB).


Contra as condições de vida dos trabalhadores

O ministro do Trabalho, Luiz Marinho, tem se empenhado para cair nas graças do capital financeiro e dos empregadores, propondo em reunião na FIESP (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo) a suspensão do direito do trabalhador a retirar - na data de seus aniversários - até 5% dos recursos que tiverem sido descontados e depositados no chamado Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) para o pagamento de eventuais verbas rescisórias. Medidas semelhantes foram adotadas pelo governo Piñera no Chile e anuladas por Boric. E para outros. Marinho disse que “atrapalha a lógica do setor, porque fragiliza o fundo de investimento. Vamos orientar com segurança isso no conselho de administração do fundo de garantia e quero ter o apoio da indústria”, solicitou o ministro.

Esse desconto foi autorizado pelo bolsonarismo para amenizar a difícil situação salarial dos trabalhadores, tirando um "bônus" de seus próprios fundos.

Segundo Marinho, muitos trabalhadores têm usado a retirada na data do aniversário como forma de financiamento. A proposta do ministro seria, assim, em defesa dos trabalhadores ignorantes que não saberiam administrar seu dinheiro. “Com esse método, o trabalhador acaba perdendo o emprego e não pode sacar o fundo porque aderiu ao saque aniversário”.

Mas o mais importante é que o ministro também pediu o apoio do setor à “modernização da legislação trabalhista”, afirmando que o governo não pretende revogar a antitrabalhista “reforma trabalhista”, mas atualizá-la. "Não é apropriado" - disse - usar a palavra revogar. O que seria dizer que temos que rever o que já foi feito. Revogar seria devolver tudo ao que era: não cabe.

O governo “popular” deixa de pé as reacionárias reformas trabalhista e previdenciária. Beneplácito dos capitalistas e bolsonaristas que veem que seu “trabalho” antioperário não teria sido em vão.


Continuísmo reacionário

Poderíamos continuar analisando as políticas do governo de frente popular de Lula para demonstrar o grande número de planos onde ele realiza políticas continuístas.

Em termos de política externa, Lula não reconheceu apenas o governo golpista de Dina Boularte no Peru, que vem massacrando seu povo (70 mortos, centenas de feridos e presos). O presidente Pedro Castillo foi deposto e preso. Lula esqueceu sua prisão pelo regime de Temer? Mas não é só isso: o governo Lula está fornecendo ao regime golpista armas e munições (bombas de gás, etc.) para reprimir o povo. Bolsonaro fez o mesmo diante da resistência ao golpe na Bolívia, enviando armas para apoiar a ditadura de Añez.

Mas diante da guerra da OTAN contra a Rússia, Lula mudou o tradicional voto de abstenção de Bolsonaro e passou a aderir a um pronunciamento pró-OTAN. Agora a ONU se juntou à declaração otanoista de repúdio à invasão de Putin. Claro, prometendo dar passos para que a Rússia se retire e assim avance em um processo de paz. A mesma linguagem de Biden e do imperialismo da OTAN.

O Ministério da Mulher desistiu até de discutir a questão do direito ao aborto. A ministra diz que Lula - que já se declarou pessoalmente contrário a esse direito - está mais preocupado com os casos de feminicidio. Em 2021, foram 1.300 feminicidios. Simultaneamente, houve mais de 500.000 abortos clandestinos, 200.000 dos quais danificaram o corpo de jovens e causaram a morte 1.000 vezes. Lula progressista ou beato?

Sobre a política em relação à Amazônia tão fortemente criticada a de Bolsonaro por sua pilhagem, o ministro do Desenvolvimento Agrário do PT anunciou que “defende que as áreas desmatadas ilegalmente sejam ocupadas com base em um programa de colonização e reflorestamento”. Por sua vez, o novo ministro da Justiça declarou "que era impossível prender 15.000 garimpeiros, que trabalham em regiões próximas". E destacou que seu objetivo é "fortalecer a presença do Estado na região" trazendo "benefícios sociais para 30 milhões de habitantes da Amazônia". Isso viria acompanhado de investimentos das potências imperialistas interessadas no estudo, proteção e exploração econômica (sustentável?) dessa floresta tropical.

Em termos de privatizações, Lira, o presidente da Câmara, saiu declarando que não haverá votação para reverter a recente privatização de Bolsonaro da Eletrobrás, ou qualquer outra. O governo Lula se adaptou a essa situação. Pelo contrário, está nomeando autoridades de toda uma série de setores estatais (Correios, etc.) a conhecidos privatistas.


O inimigo dos trabalhadores e explorados está no Planalto

Com a desculpa da luta contra o bolsonarismo e o fascismo, com a qual o governo Lula se reconcilia, todos os ataques contra o povo trabalhador e todos os avanços reacionários estão sendo deixados passar.

Claro que a direita militarista e de Bolsonaro é uma ameaça permanente ao povo e às liberdades democráticas e que deve ser enfrentada e destruída. Mas não será de mãos dadas com este regime que o conseguiremos. Lula concilia e acerta com os militares, com os bolsonaristas, com o agropoder, com o imperialismo, com as ditaduras e com todo o mosaico de exploradores.

Mas o ajuste contra o povo está sendo feito por este governo e deve ser enfrentado. A mobilização da classe trabalhadora e dos explorados nos permitirá derrotar esses ataques e colocar as massas nas ruas.

Se houver golpe, deve ser enfrentado abertamente, mas sem apoiar este governo que hoje está a cargo do imperialismo e do grande capital para administrar o ajuste produzido pela crise capitalista mundial.

As organizações dos trabalhadores dirigidas por burocracias sindicais são impotentes para enfrentar essa resistência. Eles estão caminhando para uma maior integração (e arregimentação) do Estado.

A direção burocrática da CUT havia sinalizado que se preparava para "comemorar" o dia 1º de maio, a derrota do bolsonarismo. Se coloca como um apêndice do governo. Há algumas semanas, ela pediu “mobilização” sob o lema “Menos juros e mais empregos. Não à autonomia do Banco Central!" Embora essa "mobilização" seja uma maneira de dizer. Segundo o correspondente da Infobae no Brasil, em São Paulo eram... cerca de vinte.

Agora recebeu o balde de água fria do aumento de R$ 18 do salário mínimo e do compromisso do governo de não rever as reformas reacionárias de Temer-Bolsonaro.

Sérgio Nobre, presidente da CUT, manifestou seu descontentamento com o magro aumento, afirmando que não pode festeja-lo.

Mas a burocracia sindical não rompe com a subordinação das organizações sindicais ao governo, nem mesmo quando o governo ataca abertamente os interesses dos trabalhadores e explorados. Pelo contrário, a direção da Federação Única dos Petroleiros (FUP) declarou que apoia a decisão do Governo de restabelecer a cobrança dos impostos sobre os combustíveis. Ou seja, o ataque ao bolso não só dos transportadores, mas de toda a economia popular que verá seus custos aumentarem.

É preciso mobilizar mas para um aumento real do salário mínimo e de todos os salários. Pela revogação das reformas reacionárias e antitrabalhadoras (previdenciárias, trabalhistas, etc.), pela recuperação de todas as conquistas perdidas. Para isso, é preciso promover assembleias de fábrica e sindicais que exijam a ruptura da política de passividade colaboracionista da burocracia sindical, exigir a realização de um congresso de delegados eleitos pelos trabalhadores, votar uma lista de reivindicações e um plano de luta para impô-la. Sem a luta independente dos trabalhadores contra o governo e os patrões, se levará a maiores catástrofes sociais.

O governo gaba-se de ter impedido uma greve dos carteiros ao nomear um privatista para chefiar a empresa. Tira força da passividade e desorganização das massas.

Para setores burocráticos ou de esquerda que se dizem combativos, estamos diante de “um governo em disputa”. E seria seu dever "ajudá-lo a fortalecer uma contra-ofensiva contra a direita". Mas é o governo que vem impor esses avanços reacionários, anestesiando a consciência das massas e suas vanguardas com tagarelices vazias de conteúdo de classe. De subordinação e apoio às classes dominantes.

Esta pseudoesquerda está sendo comprada-cooptada com cobranças e financiamentos do regime como fez o kirchnerismo na Argentina?

Uma coalizão formada por petistas, PC do B e setores de direita do PSOL (Resistência etc.) impuseram com uma votação minoritária a desfiliação do combativo sindicato dos docentes universitários - ANDES - da central operária CSP-Conlutas, para “aderirem” à burocrática e governista CUT. Nestes momentos de "avanço fascista" - afirmam - é necessário entrar no "diálogo" com o novo governo. O ANDES rompeu com a CUT em 2006, quando o governo anterior de Lula impôs uma reforma reacionária na Previdência Social. Agora volta a aceitar a aliança direta do sindicalismo com as políticas "neoliberais" praticadas pelo governo que falsamente se diz popular?

O bloco minoritário que rejeitou a ruptura cantou: "Sou Conlutas, sou radical, não sou capacho do governo federal".


O PSOL e o impasse da esquerda que se diz revolucionária

O PSOL, apontado por grande parte da esquerda oportunista mundial como modelo de "partido amplo" de tendências, oriundo da direita do PT, para enfrentar -supostamente - uma trajetória política anticapitalista, deu um giro de 360 graus. Manifestou-se como uma monstruosidade oportunista e eleitoralista que por mais de uma década levou grande parte da vanguarda operária, estudantil e popular a um impasse. Voltou às “origens”. Apoiou a “frente ampla” da Esperança com as candidaturas de Lula e Alckmin no primeiro turno eleitoral. E agora se integrou diretamente ao governo Lula, nomeando ministros e autoridades. Também resolveu formar um bloco unitário no parlamento com a bancada de Lula. O PSOL tornou-se um partido oficial do governo, eliminando todos os traços de oposição.

Mas os partidos de esquerda que se dizem revolucionários permanecem nessa frente. Eles são encorajados por uma política oportunista-eleitoral.

A Corrente Socialista dos Trabalhadores (CST, unida à UIT-CI junto com a Esquerda Socialista da Argentina) teve uma inventividade especial de oportunismo. Aderiu ao Polo Socialista Revolucionário que promovia o PSTU com candidaturas independentes, mas…. permanecendo no PSOL. Uma pata em cada chão, que infelizmente o Polo aceitou. Agora que as eleições acabaram, ela juntou as duas pernas... dentro do PSOL.

El Socialista, jornal da Esquerda Socialista da Argentina, transcreveu (18/01/23) uma declaração da CST do Brasil contra o motim de 8 de janeiro. Posicionam-se como assessores críticos da esquerda do governo Lula: "dizemos que Lula, o PT e o governo federal devem convocar a mobilização de rua contra os golpes do bolsonarismo". Quando fica evidente a política conciliatória do governo Lula com os militares e a direita, inclusive com setores bolsonaristas. Para a CST, "as primeiras medidas do governo Lula deveriam ter sido acertar contas com os bolsonaristas e seu projeto autoritário, sem indulto ou anistia". Mas se Lula não seguiu, nem continuará, esse conselho é porque a burguesia “democrática” que ainda ontem era bolsonarista não quer prejudicar a coesão do corpo de oficiais das Forças Armadas, centro essencial do Estado burguês .“Lula errou ao se aliar a setores de Bolsonaro no governo”, diz a CST, que não entende a continuidade da política burguesa. “Convocamos a ocupação das ruas e exigimos do governo Lula/Alckmin uma mobilização nacional e a punição de todos os golpistas”, insiste a CST. A UIT-CI repete a política de "partidos amplos" e oportunismo eleitoral que já desenvolveu no Peru com sua militância histórica dentro da Frente Ampla, o partido que salvou o Parlamento do colapso por ocasião do golpe de Merino há alguns anos .

A "Revolução Socialista" integrante da Liga Socialista Internacional (LIS que integra o MST da Argentina) manteve-se diretamente dentro do PSOL. Ela nem quis fazer a pantomima que o CST fez de ingressar no Polo Socialista Revolucionário, apesar de afirmar que luta para criar uma alternativa de independência operária e revolucionária. Não ia perder a oportunidade de ter uma candidatura. Proveniente de um processo de reagrupamento de duas correntes menores, a Revolução Socialista declara: “Nossa unificação está a serviço do fortalecimento da esquerda radical que enfrenta a liquidação do projeto fundador pela direção majoritária do PSOL. A unificação de nossas correntes é também um compromisso para interromper esse processo e recuperar o PSOL para a luta anticapitalista, com independência de classe e programa socialista”. Sem palavras, agora que o PSOL se tornou diretamente um partido do governo totalmente integrado à sua política capitalista.

“Lula errou ao se aliar a setores de Bolsonaro no governo”, diz a CST, que não entende a continuidade da política burguesa. “Convocamos a ocupação das ruas e exigimos do governo Lula/Alckmin uma mobilização nacional e a punição de todos os golpistas”, insiste a CST. A UIT-CI repete a política de "partidos amplos" e oportunismo eleitoral que já desenvolveu no Peru com sua militância histórica dentro da Frente Ampla, o partido que salvou o Parlamento do colapso por ocasião do golpe de Merino há alguns anos.


Poderá?

Lula pretende não apenas deter a rebelião popular que assola a América Latina no Brasil, mas também se apresentar diante do imperialismo como um instrumento para tentar contê-la e revertê-la em todo o continente. Conseguirá?

Todas as lideranças, organizações e militantes que se afirmam na consistente luta anti-imperialista, democrática, operária e/ou socialista devem rejeitar a política de conciliação do lulismo e enfrentar a luta por suas reivindicações. Organizações de mulheres que lutam pelo direito ao aborto; as organizações operárias pela revogação das leis reacionárias e pela recuperação de suas conquistas; os grupos anti-imperialistas pelo não pagamento da dívida pública e pela expropriação das empresas privatizadas, etc. Nesse processo, deve emergir gradualmente uma vanguarda que possa se organizar em um partido revolucionário de classe e promover uma frente revolucionária operária.