Desde o final
do ano passado que uma parcela da esquerda e da população em geral fazem um
prognóstico que se pode ouvir pelas ruas: o de que o ano de 2014 será um ano de
grandes mobilizações e protestos por todo o país.
As jornadas de
junho, que ainda encontram-se frescas na memória da juventude, irá completar
seu primeiro aniversário exatamente no mês de realização da Copa, uma revolta
latente de amplos setores da população contra o fato de que nosso país sediará
uma Copa do Mundo já se faz ouvir, enquanto que de uma forma geral faltam
recursos para áreas sociais (saúde, educação, reforma agrária, etc), ao mesmo
tempo em que a Copa intensifica o aumento da especulação imobiliária e da
carestia nas grandes cidades, justificando assim a existência do prognóstico
acima citado.
Já no inicio
deste ano, as grandes cidades foram marcadas por uma onda de protestos,
inusitados, e que tomaram os shoppings de várias capitais do Brasil. Os
“rolezinhos”, como foram chamados, se iniciaram de forma despretensiosa para
marcar os encontros da juventude da periferia e logo se transformaram em um
tipo de protesto social, que colocou a nu o verdadeiro apartheid social que
vive nosso país em pleno início do século XXI.
Os iniciadores
desse “roles” foram uma grande parcela da juventude mais humilde (em geral eram
garotos pobres, jovens, desempregados e com pouco tempo de escolaridade) das
periferias que marcam seus encontros nos shoppings para se conhecerem e se
relacionarem (como é próprio da juventude), diante da carência de centros de
lazer nas periferias das grandes cidades.
Os
“rolezinhos” foram marcados no inicio com um caráter apenas recreativo, e só
começaram a se “politizar” e a ganhar um caráter de protesto a partir da
atitude de grande parte da administração dos shoppings e dos grandes lojistas
que mobilizaram a polícia para reprimir de forma contundente esses setores. A
atitude de nossas burguesias de ter medo de qualquer aglomeração social oriunda
dos lugares mais pobres é sintomática da conjuntura que vive nosso país,
afinal, as jornadas de junho foram marcadas predominantemente por setores
“médios” da juventude e da população, e o instinto de classe da burguesia,
apavora-a, literalmente, com pesadelos, diante da possibilidade de que uma
grande massa da população proletarizada se revolte e se junte a esses setores
médios em protestos de maior amplitude e com reivindicações econômicas e
sociais mais radicalizadas.
Cabe lembrar
que as periferias das grandes cidades e suas favelas possuem cada vez mais uma
grande parcela da população, expulsa dos grandes centros principalmente pelo
aumento desenfreado no custo de vida e pela especulação imobiliária.
Como diz a
letra de uma música: “...o Haiti é aqui”, e o medo de uma grande revolta social
(a la Haiti) não é mera coincidência; a repressão se generaliza e se manifesta
de forma concentrada nas periferias. Sem contar que houve claramente um caráter
racista de tentar impedir setores da juventude de entrar nos shoppings, tendo
por critério de seleção a cor da pele do indivíduo. Uma grande quantidade de
jovens foram presos “para averiguação” como se diz no jargão policial, mas
inversamente nesse caso a repressão só fez aumentar a quantidade de “roles” e
de protestos.
Retrospectivamente
o primeiro “role” foi no shopping Itaquera no dia 08 de dezembro passado, onde
6 mil pessoas se reuniram para um encontro marcado por uma rede social, depois
foram dezenas de shoppings centers: Interlagos, Guarulhos, Tucuruvi, novamente
Itaquera; o Iguatemi obteve uma liminar na justiça contra o “role” (o que
aumentou ainda mais a revolta da juventude); e daí por diante foi difícil uma
grande capital de nosso país que não tivesse o seu “role”, e em pouco tempo a
burguesia estava no mínimo dividida, quanto a questão de se os enfrentamentos
não iriam aumentar e disseminar os “roles”.
Realmente, os
“roles” se espalharam e se “politizaram” por todo o país, com o apoio de vários
setores da esquerda, do movimento negro, dos movimentos de moradia, pela
reforma agrária e é lógico de setores mais amplos da juventude. Os protestos
ganharam a parte externa dos shoppings (diante da imensa adesão de um lado, com
o fechamento de alguns shoppings nos dias de protesto, e o aumento da repressão
do outro), setores patronais chegaram a esboçar acordos com o governo para
tentar levar os “rolezinhos” para outros lugares das cidades (parques, escolas,
etc), mas já era tarde, o caráter de revolta já tinha ganhado a simpatia de
muita gente para mudarem o palco do protesto.
Como um ensaio
geral, os “rolezinhos” esquentaram o clima para o dia 25 de janeiro, quando foi
realizada a primeira manifestação do ano contra a Copa em cerca de 13 capitais,
incluindo São Paulo e Rio de Janeiro. “Não vai haver Copa” gritavam em tom
desafiador grande parte da juventude ali presente. A repressão desenfreada por
parte dos policiais em São Paulo e a infiltração de certos “provocadores” que
estavam mais interessados em que o movimento fosse reprimido, do que levar esse
movimento a conquistar vitórias, não tirou a importância simbólica do inicio
das mobilizações de massas deste ano. A polícia em São Paulo utilizou balas de
verdade na repressão, alimentando mais ainda o ódio popular contra o aparelho
repressivo do Estado (não nos esqueçamos que o estopim das Jornadas de Junho
foi a repressão policial contra os protestos juvenis que se opunham ao aumento
das passagens de ônibus).
Todos estes
primeiros movimentos do ano funcionaram de certa forma como um “ensaio geral”
para o que virá mais adiante. A esquerda revolucionária terá como desafio
organizar os setores cada vez mais amplos que se deslocam por fora dos partidos
da esquerda governista, e que hoje está cada vez mais na contramão do movimento
de massas, que se desenvolve e se choca contundentemente contra seu governo, de
qualquer forma, 2014 começou com um mês de janeiro que nos aponta grandes
perspectivas para a luta da juventude e dos trabalhadores.