quinta-feira, 6 de outubro de 2016

AS ELEIÇÕES E O REGIME POLÍTICO

                                                                           
                     


Guilherme Giordano


O fator que mais se destaca no resultado das eleições municipais de 2016 no Brasil é que uma ampla parcela de eleitores se absteve, não comparecendo às urnas, anulou o voto ou votou em branco. Somados, abstenções, votos nulos e brancos em inúmeras cidades, inclusive nas capitais mais importantes do país, chegaram a atingir cerca de 40% do eleitorado, o que se tornou praticamente uma média nacional, e foi maior que o número de votos dos primeiros colocados.

O mosaico que se formou no mapa eleitoral brasileiro dá lugar a nada menos do que 18 partidos diferentes disputando o segundo turno. O PSDB ganhou no primeiro turno em São Paulo, das capitais, e a vitória do seu candidato folclórico expressa a derrota de alas do partido ligadas a Serra, FHC e Aécio Neves. João Dória, ex-apresentador de TV e empresário, em seu discurso para celebrar uma vitória acachapante abriu uma fenda em seu partido, ao lançar o seu principal cabo eleitoral e apoiador, o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, à presidência da república nas eleições de 2018. A luta faccional da burguesia no interior dos seus partidos e entre seus partidos recém começou, prometendo uma verdadeira guerra entre as suas diferentes frações à medida que a crise capitalista avança e torna os recursos mais escassos.

Aqueles que se colocaram a reboque da Frente Popular, que representa o seguidismo a uma das alas da burguesia, é tanta que omitem em seus balanços a rejeição de uma significativa parcela da população brasileira ao conjunto do regime político, e por outro que quando Fernando Haddad, do PT, por exemplo, elegeu-se em São Paulo foi com o apoio formal e escancarado de Paulo Maluf. 

O PT foi derrotado em todo o país, chamando atenção da perda de inúmeras prefeituras em quase toda a região nordeste, e na capital gaúcha, Porto Alegre, tradicional reduto do partido, que chegou a governar por 16 anos ininterruptos.

O PSTU, depois de ter sofrido um racha de quase metade do partido, encolheu ainda mais em termos de votos, tendo perdido os dois vereadores que tinha em Belém do Pará (Cleber Rabelo foi lançado candidato a prefeito) e em Natal, Rio Grande do Norte (Armanda Gurgel, que foi para o MAIS, tendo sido a 2ª candidata mais votada nesta eleição, não eleita pelo coeficiente eleitoral – voto na legenda).

O PSOL obteve êxito no Rio de Janeiro, com seu candidato, Marcelo Freixo, e em Belém do Pará, com Edmilson Rodrigues (tendo sido este prefeito pelo PT naquela capital, durante dois mandatos consecutivos), tendo ido ambos para o 2º turno.

O MRT/PSOL, que corresponde ao PTS na Argentina, tirou um balanço costumeiro e histórico do morenismo de auto-propagandismo dos seus “milhares” de votos pelo país. Em São Paulo, sua candidata precisou esconder com mil e um artifícios e manobras a candidatura majoritária do PSOL, que era nada mais nada menos do que Luiza Erundina, que rompeu com o PT pela direita, após ter governado a cidade para os interesses da FIESP. Na eleição municipal, em 2004, Erundina foi candidata pelo direitista PSB com nada mais, nada menos do que o atual presidente “progressista” golpista, Michel Temer como vice em sua chapa. O PT se apoiou para compor a chapa Dilma Roussef/Michel Temer, em 2010. O “progressismo” de Temer e seu “progressista” PMDB, desculpem-me o trocadilho, “progrediu” para um golpe de estado. Nesse caso, vale para o MRT o ditado bíblico com uma emenda: “Diga-me com quem andas, ou quem pensa que não andas, que te direi quem és.”

Um capítulo à parte tem que ser dedicado ao MES/PSOL de Luciana Genro, em Porto Alegre, corrente que corresponde ao MST na Argentina. Luciana Genro disparou nas pesquisas no início da eleição e desenvolveu uma campanha reacionária, moralista, típica da pequena-burguesia conservadora. Seu mote de campanha era as “Mãos limpas” (para quem foi acusada por toda a esquerda inclusive no interior do próprio PSOL de ter sido financiada por grandes empresários, em eleições anteriores). No último debate que ocorreu em cadeia regional, transmitido pela Rede Globo, para boa parte do estado do Rio Grande do Sul, revelou sua face caricatural ao afirmar que almejava ser uma personagem de uma novela da própria Rede Globo, que tem audiência nacional em horário nobre desde a época da ditadura militar (nesse caso, foi para legitimá-la). Essa comédia ao vivo não parou por aí: Luciana Genro, bem aos moldes dos candidatos aventureiros que viram motivo de piadas nas eleições propôs o Tele-saúde e um controle remoto a ser distribuído para cada cidadão e cidadã, que acionaria uma Central de Segurança, e com isso, viaturas policiais estariam em poucos segundos no local da ocorrência. Foi com esse programa que o MES compareceu nas eleições em Porto Alegre. Luciana despencou assim para 5º lugar, tendo virado motivo de piadas, a tal ponto de estar sendo chamada de Beatriz, a personagem da novela da golpista Globo. Tal vexame foi amenizado pela votação que obteve sua candidata a vereadora, Fernanda Melchiona, que obteve a maior votação para o legislativo municipal, tendo contribuído para a eleição de mais dois vereadores do PSOL na capital gaúcha.

O regime democratizante, que é resultado do continuísmo e não da ruptura com a ditadura militar, vai caminhando “muy despacito” para seu total esgotamento. A vitória da direita nas eleições municipais não expressa o enorme descontentamento das amplas massas com suas péssimas condições de vida, que estão sendo assoladas principalmente com o flagelo do desemprego. O desencanto com o PT, que está pagando caro pela estratégia política que adotou, de colaboracionismo com a burguesia e com o imperialismo, não significa, muito pelo contrário, um aval aos partidos de direita, em especial, o PSDB, que por ora, circunstancialmente, capitalizou muito parcialmente um êxito eleitoral. 

A crise mundial do capitalismo que agora atinge em cheio todo o continente latino-americano dará o tom dos recursos que os golpistas “vitoriosos” terão disponíveis para enfrentar uma tendência à rebelião popular, que está por ora contida pela política de governabilidade do golpismo eleita pela CUT e pelo PT. Uma greve geral contra o conjunto do regime político é a resposta necessária da classe trabalhadora para lutar contra o golpe e contra o ajuste que o novo governo já prepara.