Uma
publicação de simpatizantes da CRQI (Coordenação pela Refundação da IV
Internacional) no Brasil
UMA COPA MUITO QUENTE
Dilma
Rousseff tinha a ilusão de que a campanha publicitária para e durante a Copa
serviria como operativo de distração frente à crise econômica e social que se
agrava no Brasil e em todo o Mercosul. Em um ano de manifestações, pelo menos
13 pessoas morreram durante os protestos. Ao todo, foram três mortes no estado
de Minas Gerais e em São Paulo, duas nos estados de Rio de Janeiro e Pará e uma
nos estados de Goiás, Rio Grande do Sul e Piauí. Sem contar o assassinato do
pedreiro Amarildo nos porões da polícia do Rio de Janeiro, além dos operários
mortos nas obras para a construção de estádios. Ao todo, as mortes vinculadas à
Copa e à repressão dos protestos superam vinte trabalhadores.
E
o tiro de Dilma saiu pela culatra. Os gastos exorbitantes em estádios e em
obras sem utilidade social, e a corrupção generalizada, revoltaram o povo brasileiro.
O maior proletariado da América Latina se pôs em movimento. Metroviários,
professores, indígenas, sem terra e sem teto, metalúrgicos, estudantes estão
mobilizados contra o governo. As privações da população que se agravam com a
crise, contrastam com o desperdício multimilionário da Copa.
O
capitalismo brasileiro, nas mãos do PT, conseguiu o que parecia impossível: que
os brasileiros se mobilizassem contra uma Copa organizada em seu próprio país.
Os povos estão determinados a fazer com que crise seja paga pelos capitalistas
e não pelos trabalhadores. Para evitar greves da polícia durante a Copa e
garantir a lealdade do aparato repressivo frente aos protestos, a presidenta
Dilma Rousseff cedeu às exigências dos fardados, e anunciou um aumento salarial
de quase 16% para a Polícia Federal, no dia 3 de junho. Apagou o fogo com
gasolina: um dia depois, os trabalhadores do metrô de São Paulo entraram em
greve por tempo indeterminado exigindo um aumento semelhante. Tocaram um nervo
sensível: as linhas do metrô levam ao Itaquerão, onde no dia 12, o pentacampeão
jogou a partida de abertura com a Croácia.
A
greve recebeu o ataque compacto do regime burguês. Rousseff e o governador
Alckmin (do PSDB) coincidiram publicamente em denegri-la. A Justiça ordenou uma
espécie de essencialidade pela qual os trabalhadores deviam garantir um serviço
100% durante as horas de pico e 70% no resto do dia. A Polícia Militar atacou
com gás lacrimogêneo, balas de borracha e granadas de efeito moral contra os
grevistas, por duas vezes. 42 trabalhadores foram demitidos em retaliação. Mas
os metroviários se mantiveram em pé e contam com o apoio dos movimentos
populares.
A
extraordinária greve do metrô de São Pablo veio coroar o caminho tortuoso do
governo brasileiro para a Copa, atravessado pela mobilização popular contra as
negociatas e os gastos faraônicos, e por uma ascensão do movimento operário
como não se via desde a queda da ditadura. São Paulo viveu a também a greve dos
rodoviários e vive a dos professores e funcionários universitários (USP. Unesp,
Unicamp). Rio viveu a dos garis e a do Comperj.
As
pesquisas para as eleições presidenciais, entretanto, mostram que o declínio
persistente da imagem de Dilma Rousseff não é capitalizado pela oposição – a
abstenção voltou a crescer nas pesquisas, de 16 a 25% de acordo com os números
mais recentes.
Lula
e Dilma têm causado, com a sua suposta "festa popular" e a realização
da "Copa das Copas", um efeito paradoxal: em vez da "unidade
nacional" futebolística, o acirramento da luta de classes em uma das mecas
do futebol mundial. A Copa começou com manifestações populares em pelo menos
catorze cidades. A bola começou a rolar, e a revolta popular também.
A
esquerda brasileira não está à altura das circunstâncias, pois está dividida organizativamente,
e marginalizada politicamente. O PSOL anunciou que o senador Randolfe Rodrigues
desistiu da candidatura a presidente pelo partido: deve ser substituído pela ex
deputada Luciana Genro (RS). Não dá para ocultar que a campanha eleitoral do
PSOL estava em crise, assim como toda sua política de partido - federação sem
programa nem objetivos classistas.
Vamos fortalecer a unidade dos povos
da América Latina para lutar pelo partido que importa: o da luta pelo trabalho,
educação, saúde, terra e água. Pelo governo dos trabalhadores e pelos Estados
Unidos Socialistas da América Latina. Os deputados do Partido Obrero da
Argentina propuseram a uma delegação do Conlutas e do PSTU, que visitou Buenos
Aires, a realização de uma Conferência Latino-Americana da esquerda
revolucionária e do classismo. Esse é o caminho a seguir: a unidade revolucionária da esquerda classista,
nacional e internacional.
Os R$ 8 bilhões gastos com a construção
dos estádios para a Copa do Mundo equivalem ao dobro do investido pelo governo
federal em saúde em 2013 e é maior que valor de investimentos em educação no ano
passado. Em 2013, o Ministério da Saúde investiu R$ 3,9 bilhões. No Ministério
da Educação, os valores aplicados no exercício passado foram de R$ 7,6 bilhões.
Em defesa às críticas em relação a disparidade entre os gastos com os estádios
da Copa e os investimentos nas áreas, Dilma afirmou que os “investimentos”
federais nas áreas foram de R$ 825 bilhões desde 2010, mais de cem vezes o gasto
em estádios – R$ 8 bilhões. O valor, no entanto, diz respeito a todos os
dispêndios com saúde e educação, desde o pagamento de pessoal aos gastos com o
custeio. De acordo com dados do Ministério do Planejamento, de 2010 para cá, R$
719,6 bilhões foram gastos nos ministérios da Saúde e Educação, considerados os
valores correntes de cada ano. Os investimentos representam apenas R$ 47,5
bilhões deste montante. Dilma também afirmou que R$ 106 bilhões serão “investidos”
em saúde em 2014, e r$ 83,3 bilhões em educação. O orçamento atualizado para os
Ministérios prevê dotações ainda maiores – R$ 106,7 bilhões e R$ 112,4 bilhões,
respectivamente -, mas os recursos orçados para investimentos somam R$ 9,9
bilhões e R$ 14,1 bilhões. Em termos de comparação exclusivamente em
investimentos, com os R$ 8 bilhões gastos na construção dos estádios seria
possível construir 4.000 Unidades de Pronto Atendimento, que cobrem locais que
possuem entre 100 mil e 200 mil habitantes e recebem até 300 pacientes
diariamente. Com o valor também seria possível erguer 2.263 escolas com
capacidade de 432 alunos por turno, cada. Uma escola com 12 salas de aula e
quadra coberta, financiada pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação
(FNDE), custa R$ 3,5 milhões.
ABERTURA DA COPA: REPRESSÃO EM SÃO PAULO
Desde o início da manhã de
quinta-feira 12de junho, a Força Tática da Polícia Militar de São Paulo usou da
violência para coibir a realização do protesto que denunciava os gastos públicos
excessivos com a Copa do Mundo e pela reintegração dos metroviários de São
Paulo, além de reivindicar mais investimento público em saúde e educação
públicas. Convocadas para a manhã na zona leste de São Paulo, as duas
manifestações de rua que pretendiam criticar a realização da Copa do Mundo
horas antes da abertura do torneio foram duramente reprimidas pela Polícia
Militar. Com um efetivo multitudinário, a corporação sitiou toda a região no
entorno das estações Tatuapé e Carrão do Metrô, onde os manifestantes haviam
combinado de se encontrar para saírem em passeata. Dezenas de caminhões do
choque, viaturas e motocicletas estavam apoiadas por helicópteros e cavalaria.
A violência das forças de segurança foi tão grande que as marchas sequer
chegaram a ocorrer.
Às 9h15 da manhã, grande número de
soldados, com escudos e capacetes, já estava instalado dentro da estação Carrão
do Metrô, revistando pessoas que “aparentavam” ser manifestantes: jovens
trajados com roupas pretas, com cortes de cabelo incomuns, negros e com barba.
Mochilas foram abertas e supervisionadas sem qualquer justificativa. De lá
partiria uma das passeatas marcadas, cuja intenção era caminhar até o cordão de
isolamento em torno da Arena Corinthians, em Itaquera, estádio que sediaria o
jogo de abertura da Copa. Antes da chegada dos manifestantes, três linhas de
soldados do batalhão de choque já estavam em formação de ataque do lado de fora
da estação, com escudos, armas e bombas de gás lacrimogêneo.
Os que compareceram para dar seu
grito de revolta não tiveram sequer a oportunidade de se reunir no local
marcado. Após um leve bate-boca entre soldados e cidadãos revoltados com a
magnitude do aparato policial, às 10h15, a tropa deu início à ofensiva,
lançando bombas de gás lacrimogêneo contra as não mais de 50 pessoas que
estavam por ali. Depois da correria, os
manifestantes tentaram se reagrupar ao redor da estação Carrão do Metrô. E
passaram a gritar palavras de ordem contra os policiais que acabavam de
agredi-los gratuitamente. “Não acabou, tem de acabar, eu quero o fim da Polícia
Militar”, bradavam. A reação da tropa não tardou, e veio com mais uso da força.
Quinze minutos depois do primeiro ataque, por volta das 10h30, uma nova
investida policial acabou ferindo uma jornalista da rede de televisão
norte-americana CNN. A repórter foi atingida no pulso por um estilhaço de bomba
de gás lacrimogêneo e atendida por socorristas voluntários.
Após dois ataques seguidos contra os
manifestantes, que começavam a se dispersar, a PM resolveu agredir deliberadamente
as dezenas de repórteres, fotógrafos e cinegrafistas brasileiros e estrangeiros
que registravam a operação. Às 10h40, um policial sem etiqueta de identificação
saiu detrás da linha de escudos e lançou uma bomba de gás: pelo menos cinco
pessoas acabaram feridas por estilhaços nos braços e nas coxas. Entre elas
estava um morador de rua. Às 11h, uma hora depois do pretendido início do protesto,
os arredores da estação Carrão estavam liberados...
NOVA DIMENSÃO DA PRECARIZAÇÃO DO TRABALHO DOCENTE
José Menezes Gomes
Na mobilização dos professores
universitários federais, quando se buscava a aprovação do indicativo de greve,
constatamos uma adesão maior nas universidades federais do Norte e Nordeste,
especialmente partindo da precarização extrema vinda do interior. Parte deste
fenômeno pode ser explicada pelos dados seguintes. Na UFAL de Maceió, o
departamento de economia tem 23 professores para 45 disciplinas. Nesta mesma
universidade, o curso de economia de Santana do Ipanema tem 12 professores e 45
disciplinas. Aqui temos professores em média com 5 disciplinas, onde o
coordenador geral tem 7 disciplinas.
Neste curso, o problema não está
apenas na falta de professores, mas também na ausência de prédio próprio, pois
funciona em prédio alugado de uma escola privada, no turno não usado por ela.
Destaque-se que a direção desta escola não queria renovar o aluguel. Além
disso, os alunos não dispõem de Restaurante Universitário, Casa de Estudante,
bolsa permanência, iniciação científica, etc. Os alunos da Ufal Santana
entraram em greve dia 29 de maio por uma longa e justa pauta de reivindicação.
Neste polo temos uma grande evasão de alunos, de professores e técnicos
administrativos. Esta evasão em grande escala representa uma saída passiva ao
elevado grau de precarização desta interiorização.
Enquanto isto, no curso de economia
na UFJF, em Governador Valadares, tem 16 professores para atender as suas
disciplinas. Se compararmos o curso de economia da UFAL em Maceió com o de
economia de Santana do Ipanema teremos uma diferença de 11 professores a menos
no interior. Comparando a UFAL Santana com o curso de economia de Gov.
Valadares teremos 4 professores a menos para Santana. Se compararmos o curso de
economia da UFAL Maceió com o curso de economia de Gov. Valadares teremos 7
professores a mais para da UFAL Maceió, que tem um Mestrado. Aqui fica bem
claro a distinção que existe na implantação do REUNI entre os Campus do
Interior entre Gov. Valadares e Santana UFAL e dentro da mesma UFAL.
Os professores do Nordeste e do
interior vivem um verdadeiro terror nas condições de trabalho e baixa
remuneração, já que em grande parte são mestres, que tem esperar dois anos para
passar a receber como professor Assistente, início de carreira como proposto no
acordo assinado pelo PROIFES em 2012. Isto não significa que os demais
professores não estejam atuando em condições precárias, porém por outros meios,
já que estão submetidos ao controle patronal estabelecido pela CAPES, tendo uma
grande carga de trabalho. O certo é que o REUNI mantém o principio da
existência dos centros de excelências e os grandes escalões para a chamada
periferia proposto por FHC. Além desta distinção, temos diferenças entre a
capital e o interior. As várias tentativas de desconstrução da carreira docente
de 1987 iniciadas com FHC se aprofundaram com Lula e Dilma. Esta diferenciação
entre os docentes não se deve apenas a questão geográfica, mas as etapas de
desconstrução dos direitos dos SPF’s. Atualmente temos os professores com mais
titulação e remuneração nas capitais onde atuam na pós-graduação. Todavia, nas
capitais do nordeste temos possivelmente 30% dos professores que estão fora da
carreira por não terem concluído doutorado. Os professores que atuam no
interior em grande parte são professores novos que estão em prédios e
instalações precárias, sem laboratórios, com quase o dobro da carga de aulas,
sem direito a aposentadoria pública e integral e não dispõem de liberação para
capacitação, o que dificulta a progressão na carreira. Estes desafios ameaçam
com a fragmentação política dos professores e estão presentes nas deliberações
sobre os indicativos de greve. Todavia, precisamos recompor os laços de
solidariedade entre os professores. Para tanto é fundamental a defesa da
Universidade com o seu tripé: Ensino, Pesquisa e Extensão, pois esta concepção
pressupõe a existência dos direitos dos trabalhadores.
Se as reitorias, como braços do MEC,
conseguiram impor a brutal jornada de trabalho aos novos professores,
especialmente àqueles que estão atuando no interior, o passo seguinte será
adotar este padrão nos cursos das capitais. A propósito, neste momento vimos o
enfrentamento ao REUNI, principalmente onde ele é mais precário. Mas também
temos a greve nas três universidades paulistas, que de forma diferente questiona
o processo de expansão que teve inicio nas três universidades paulistas (USP,
UNESP e UNICAMP), desde 2000 no governo de São Paulo do PSDB, e no governo
federal do PT, desde a introdução do REUNI em 2007. Dois governos que
aparentemente seriam diferentes, mas que praticam a mesma ação: fazer mais com
menos orçamento para garantir o pagamento do serviço da dívida pública. A
precarização do trabalho sobre os trabalhadores do setor público e por sua vez
sobre os professores é a manifestação do mesmo fenômeno que marcou o inicio dos
chamados ataques neoliberais, nos trabalhadores do setor privado, que agora se
expande entre os professores. O adoecimento docente ocorre seja entre os
professores associados ou entre os novos, tendo em vista a intensificação do trabalho.
Os professores devem se unir à luta dos demais trabalhadores contra a
precarização do trabalho.
MOBILIZAÇÕES CRESCEM NAS UNIVERSIDADES FEDERAIS
Os professores de todo o país estão
aumentando o nível de mobilização. Em algumas instituições, o descontentamento
com as precárias condições de trabalho é tamanho que as categorias da
comunidade universitária estão deflagrando paralisações e greve. Na
Universidade Federal de Sergipe (UFS), os docentes estão em greve desde o dia 3
de junho. Em outros locais, como a Universidade Federal de Uberlândia (UFU) e a
Universidade Federal do Pará (UFPA), a categoria também está fortalecendo a
luta. Na UFS, que quase todas as atividades docentes estão paralisadas na
universidade, e a mobilização chega a todos os campi, contra a enorme carga de
atividades administrativas transferidas ao corpo docente e a falta de
equipamentos básicos de laboratórios. Dois campi da UFS estão fechados, também
por falta de condições de trabalho. O campus de Lagarto não apresenta possibilidade
de realização de atividades práticas para os estudantes da área da saúde, nem
mesmo para os formandos. Já o campus de Laranjeiras vem sendo palco de atos de
violência que assustaram a toda a comunidade acadêmica.
Já no Pará, os docentes da UFPA realizam
uma paralisação de três dias. Entre
outras reivindicações, a Associação dos Docentes da UFPA (Adufpa-SSind) cobra
da Reitoria da universidade o arquivamento da proposta de resolução que
estabelece critérios produtivistas para progressão na carreira docente. A
paralisação foi definida em assembleia geral da Adufpa, realizada no dia 4 de
junho. Na assembleia, os professores rejeitaram novamente a resolução da
reitoria, por entenderem que a legislação vigente e a própria lei que criou a
carreira já estabelecem os critérios para progressão. Os docentes avaliaram que
somente a progressão para titular dentro da carreira deve ser objeto do
documento, pois a Portaria 982, de outubro de 2013, se refere somente a
ascensão à Classe Titular, que precisa ser regulamentada. Em Ituiutaba,
interior de Minas Gerais, onde está localizado o campus Pontal do Triângulo
Mineiro da UFU, também há mobilização. Docentes, técnico-administrativos em
educação e estudantes realizaram uma paralisação a 10 de junho para cobrar melhores
condições de trabalho e de estudo: a adesão foi grande e a luta por melhores
condições deve continuar, buscando mais recursos para acessibilidade,
assistência estudantil e para a garantia da real qualidade no indissociável
tripé de ensino, pesquisa e extensão.
O CONGRESSO CONTRA O DIREITO
DE GREVE NOS SERVIÇOS PÚBLICOS
Um relatório sobre o assunto está em
debate na Câmara: ele eleva praticamente todas as categorias do funcionalismo a
"serviço essencial", além de definir que a greve só pode ocorrer com
paralisação parcial e nunca com 100%. O relatório é de autoria do senador
Romero Jucá (PMDB-RR) e proposto como substitutivo ao Projeto de Lei do Senado
(PLS) 710, de 2011, de autoria do senador Aloysio Nunes (PSDB-SP). O tucano já
havia elevado de 11 para 21 os serviços considerados essenciais, e Jucá somou à
lista outros dois, incluindo os serviços diplomáticos e de educação infantil e
fundamental, implicando quase todas as categorias nessa condição. Ambos os
textos fixam um percentual mínimo de trabalhadores que devem permanecer nos
postos durante o movimento grevista. O "piso" de trabalhadores que
devem continuar na ativa em caso de greve, pelo projeto de Jucá, ficaria em 50%
da categoria, em qualquer caso. Se o serviço é considerado essencial, o percentual
sobe para 60%. E no caso da segurança pública, passaria a ser obrigatório que
80% dos trabalhadores sigam nos postos. A lei é dura: se esses percentuais
forem desrespeitados, a greve será imediatamente considerada abusiva, sem
necessidade de julgamento da Justiça do Trabalho sobre o assunto.
A Lei 7.789, de 1989, que trata do
"exercício do direito de greve" não define um mínimo de trabalhadores
em atividade nos serviços essenciais, mas coloca a questão como
responsabilidade de trabalhadores e patrões, que devem definir o percentual em
comum acordo. A nova norma, que independe de diálogo entre trabalhadores e
patrões, retira os empregadores inteiramente do debate. A mesma norma define 11
serviços como essenciais, como, por exemplo, o tratamento e o abastecimento de
água, a assistência médica e hospitalar, o transporte coletivo e o controle de
tráfego aéreo.
No caso do Metrô de São Paulo, após o
descumprimento, por parte do sindicato, da determinação sobre a quantidade
mínima de trabalhadores na ativa, a Justiça impôs uma segunda multa, de R$ 500
mil por dia, para impedir a continuidade da paralisação. A Justiça Trabalhista
decidiu ainda pelo desconto dos dias parados e autorizou a demissão de
grevistas – o que se realizou no dia seguinte ao julgamento, dia 9 passado,
quando 42 dirigentes e delegados sindicais foram dispensados por justa causa.
Dias antes, o governo paulista já havia recorrido à força da Tropa de Choque da
Polícia Militar para acabar com um piquete na estação Ana Rosa, da Linha 1-Azul
do Metrô. Os únicos atos de ilegalidade durante o processo da greve, iniciado
dia 5 último, foram do governo estadual e do Judiciário. Os trabalhadores
seguiram todos os passos da legislação para a realização da greve. A série de
ilegalidades que se viu foram as ações para afastá-los da greve: imposição de
100% de operação dos trens em horário de pico, não se dispor a negociar esse
atendimento mínimo e o uso de força policial para impedir piquetes.
A Justiça do Trabalho chegou ainda a
congelar preventivamente R$ 3 milhões do Sindicato dos Metroviários de São
Paulo para garantir o pagamento das multas pelas paralisações que se
concretizaram após o julgamento do TRT, que somam R$ 900 mil, e também das que
poderiam ter ocorrido, caso os trabalhadores seguissem com a greve por mais
dias. Criticado pelo golpe às finanças da entidade, o tribunal voltou atrás e
definiu o congelamento do valor exato das multas devidas. Uma situação
semelhante ocorreu em 1995, quando os petroleiros realizaram uma paralisação
nacional que durou 32 dias, com o objetivo de impedir a privatização da
Petrobras. O Tribunal Superior do Trabalho julgou a greve abusiva no sétimo dia
e o então presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB, 1995-2002) demitiu 88
trabalhadores e puniu centenas com suspensões e advertências. Cada um dos 20
sindicatos estaduais que participaram da paralisação recebeu multa de R$ 2,1
milhões. Apenas em 2003, a Federação Única dos Petroleiros (FUP) conseguiu a
anistia contra 88 demissões, 443 advertências, 269 suspensões e 750 punições de
trabalhadores que participaram das greves.
E AGORA, GERALDO?
Jorge Luiz Souto Maior
Não satisfeito com as várias
ilegalidades já cometidas contra o direito de greve, ilegalidades estas que, de
fato, atingem toda a classe trabalhadora, o governador de São Paulo, que
insiste em dizer que “ninguém está acima da lei”, afrontou uma vez mais a ordem
jurídica ao determinar a dispensa arbitrária e por justa causa de 42
metroviários. A arbitrariedade está tanto no procedimento adotado, o envio de
um telegrama, com a notícia da dispensa, para as casas dos empregados, como se
estes fossem estranhos, quanto no próprio fundamento utilizado: Informamos o
seu desligamento da Companhia por justa causa a partir do dia 09/06/14, com
fundamento no artigo 482, alínea “b”, da Consolidação das Leis do Trabalho e no
artigo 262 do Código Penal. Fica assegurado o seu direito de interposição do
Recurso Administrativo previsto no Acordo Coletivo, no prazo de 3 (três) dias
úteis a contar do recebimento deste telegrama. (Enviado no dia 09/06/14, às
10h07)
Vale lembrar que o julgamento da
greve se deu no dia 08/06/14 e, portanto, o envio do telegrama às 10h07 do dia
09/06/14 não esteve, obviamente, relacionado a fato praticado após a decisão
judicial sobre a greve. Aliás, não está relacionado a fato algum. O telegrama
diz apenas que o empregado está dispensado com base na alínea “b”, do art. 482,
da CLT, que trata das figuras mais abertas e de conceituação mais complexa da
legislação trabalhista: “incontinência de conduta ou mau procedimento”.
A “incontinência de conduta”
caracteriza-se pela vida irregular incompatível com a condição ou com o cargo
ocupado pelo empregado. Antônio Lamarca conta que a maioria dos autores
relaciona esse tipo à vida sexual desregrada do empregado, com o que, em
hipótese alguma, concorda Lamarca, o qual restringe a hipótese a atitudes
sexuais desregradas no âmbito da empresa. Amauri Mascaro Nascimento diz que se
trata de um comportamento irregular incompatível com a moral sexual, desde que
relacionada com o emprego.
Mau procedimento está em todo o ato
que revela quebra do princípio de que os contratos devem ser executados de boa-fé.
Ambas são fórmulas que não dizem, concretamente, nada, trazendo consigo o grave
risco de servirem para dizer tudo, isto é, servirem a qualquer propósito, pois
se algo não tem um sentido preciso pode ter qualquer sentido.
Fica evidenciado que se utilizou de
fórmula aberta, para que depois fosse preenchida, deixando-se, inclusive, o
parâmetro jurisprudencial normalmente utilizado para situações análogas, que é
o de configurar a conduta do empregado que não retorna ao trabalho após a
declaração da ilegalidade da greve como ato de insubordinação (art. 482, “h”,
da CLT) ou abandono de emprego (art. 482, “i”, da CLT), sendo que na primeira
hipótese ter-se-ia uma gradação que passaria pela advertência e pela suspensão,
antes de se chegar à justa causa, e na segunda, somente se completaria após 30
(trinta) dias de faltas.
Para se chegar a uma justa causa por
mau procedimento o trabalhador teria que cometer um ato com tal gravidade,
totalmente contrário à boa fé, que inviabilizasse por completo a continuidade
da relação de emprego, sendo que se teria que levar em consideração também a
condição pretérita do trabalhador, pois a justa causa é sempre individualizada.
Além disso, dentro de um contexto de greve a justa causa se examina com muito
mais rigor, para que não represente ato de represália contra aqueles
trabalhadores que foram os mais ativos no movimento.
Ocorre que não é de fato concreto
algum que se trata. O telegrama condena a partir de uma simples citação ao
artigo, abrindo prazo para recurso apenas para cumprimento formal de preceito
de Acordo Coletivo, que confere uma garantia ainda maior aos trabalhadores
contra arbitrariedades na dispensa. Mas recorrer do quê? Qual é a acusação?
No aspecto do outro artigo citado no
telegrama, o do Código Penal, a questão é ainda mais grave, pois o trabalhador
foi acusado de ter incorrido em um crime, e, concretamente, já foi condenado
com a pena da perda do emprego, sem qualquer menção ao ato cometido, fazendo
Kafka estremecer no túmulo. Não é demais lembrar que nos termos da decisão do
STF, proferida no RE 589.998, a dispensa, mesmo sem justa causa, de empregado
de empresa pública deve ser motivada e a simples adesão à greve não constitui
falta grave (Súmula 316, do STF), o que não se altera mesmo com a declaração
judicial da abusividade ou ilegalidade da greve. Se os fundamentos fáticos para
as dispensas fossem o não retorno ao trabalho e a participação ativa em greve
considerada ilegal, que por si não ensejaria à justa causa, como visto, não
seriam atingidos, como se deu, apenas alguns trabalhadores, seletivamente
escolhidos.As dispensas de 42 metroviários, portanto, estão revertidas de grave
ilegalidade, deixando transparecer que foram promovidas, então, em represália,
com o objetivo de punir os trabalhadores como um todo pela greve e fazendo-o de
modo a gerar medo nas demais categorias de trabalhadores.
No propósito de penalizar os
trabalhadores, aliás, o governador não mediu esforços. Seguindo a linha de
tratar movimentos sociais, estudantis e trabalhistas como casos de polícia, o
que já havia feito quando enviou um enorme contingente policial (400 homens,
dois helicópteros, cavalaria e diversas viaturas) para retirada de estudantes
que ocupavam, em ato político, a reitoria da USP, em 2011; quando promoveu
operação de guerra para desocupação do Pinheirinho, em São José dos Campos, em
2012; quando determinou ataque policial aos manifestantes do MPL, em 2013;
quando, no dia 22 de fevereiro de 2014, autorizou que 260 pessoas, dentre as
10.000, que protestavam contra os gastos da Copa, fossem cercadas pela polícia
e ficassem, então, em cárcere privado, na rua, com sua liberdade subtraída, sem
que tivessem cometido qualquer tipo de ilícito; quando, no último dia 15 de
maio, determinou que a polícia fosse para cima dos manifestantes e desmontasse
mais um protesto que se realizava contra os gastos da Copa; o governador, por
último, na semana passada, utilizou a tropa de choque para coibir piquetes
pacíficos dos metroviários e, pelo uso da mesma força, sem qualquer autorização
judicial, impediu que uma manifestação de solidariedade à greve dos
metroviários ocorresse, levando à prisão 13 trabalhadores e chegando ao ponto
extremo da prisão de um estudante da Faculdade de Direito da PUC/SP, Murilo
Magalhães, que acusa ter sido torturado, o que exige apuração urgente, com
bastante rigor, vez que ameaça abrir a porta ao regime ditatorial. A situação é
extremante grave e nos faz indagar: que Estado é esse que agride e prende
pobres, estudantes e trabalhadores que estão lutando por construir uma
sociedade melhor. Ocorre que mesmo diante de tantos ataques, os metroviários,
com apoio de diversos segmentos da sociedade, assumindo a greve como direito
fundamental e atuação política, resolveram manter-se em luta, sendo que desta
feita pela readmissão dos trabalhadores ilegalmente dispensados.
Nesse quadro, o que vai fazer o
governo do Estado? Vai render-se às evidências e reconhecer o direito de greve
dos metroviários e sentar-se, com responsabilidade, para uma negociação? Ou vai
manter-se na ilegalidade, promovendo, por consequência, a ocorrência de uma
situação de total desarranjo na cidade de São Paulo justamente no dia em que o
mundo terá seus olhos voltados para cá? Vai mandar baixar o cacete nos
trabalhadores, conduzindo-os coercitivamente ao trabalho? Vai mandar prender
todos que forem às ruas em solidariedade aos metroviários? Vai determinar a
prisão, sem processo, de 70% da população que apoia a greve? Vai calar as falas
contrárias à política de criminalização dos movimentos sociais e estudantis e,
agora, das reivindicações trabalhistas? Vai usar a força policial para impedir
que se apurem as acusações de corrupção envolvendo o Metrô? E depois? Nas
eleições? Vai ameaçar de prisão a quem declarar voto em outro candidato? E agora,
Geraldo?
Teoria e Programa
A DERROCADA DO
CAPITALISMO
Rosa Luxemburgo
Ao rever o programa socialista,
Bernstein começa por abandonar a teoria do desmoronamento do capitalismo. Ora
essa teoria é a pedra de fecho do socialismo científico. Rejeitando-a,
Bernstein provoca necessàriamente o desabamento de toda a sua concepção
socialista. Ao longo da discussão, é obrigado, para sustentar a sua afirmação
inicial, a abandonar sucessivamente, uma após outra, as posições socialistas.
Sem a derrocada do capitalismo, a
expropriação do capitalismo é impossível. Bernstein renuncia a essa
expropriação e coloca como objetivo do movimento operário a realização
progressiva do "princípio cooperativo". Mas o sistema cooperativo só
pode ser realizado no interior de um regime capitalista. Bernstein renuncia à
socialização da produção e contenta-se em propor a reforma do comércio, o
desenvolvimento das cooperativas de consumo.
Mas a transformação da sociedade
através das cooperativas de consumo, mesmo com o apoio dos sindicatos, é
incompatível com o desenvolvimento natural e efetivo da sociedade capitalista.
Bernstein renuncia, portanto, à concepção materialista da história.
Mas a sua própria concepção do
desenvolvimento económico é incompatível com a teoria marxista da mais-valia. É
por isso que Bernstein abandona a teoria marxista do valor e da mais-valia e,
simultaneamente, toda a doutrina económica de Marx.
Não pode haver luta proletária de
classes sem um objetivo final determinado e sem base económica na sociedade
atual. Bernstein abandona a luta de classes e prega a reconciliação com o
liberalismo burguês.
Entretanto, numa sociedade de
classes tal reconciliação é um fenómeno natural e inevitável; Bernstein
contesta, por fim, a própria existência de classes na nossa sociedade: a classe
operária é para ele uma massa de indivíduos isolados e dispersos, não só
política e intelectualmente, mas também economicamente. A burguesia, aglomerada
politicamente por interesses económicos, também não constitui, segundo ele, uma
classe, e a sua coesão só é mantida por uma pressão exterior de cima ou de
baixo.
Mas, se não existe fundamento
económico na luta de classes e, se se nega, no fim de contas, a própria
existência de classes, afirma-se, por isso mesmo, a impossibilidade não só de
uma luta futura do proletariado contra a burguesia, mas ainda a sua luta
anterior. A própria socialdemocracia e os seus êxitos tornam-se totalmente
incompreensíveis. Ou então se explicam como o resultado da pressão política do
governo; surgem não como uma consequência natural, histórica, mas como o
resultado fortuito da política dos Hohenzollern; representam não os filhos
legítimos da sociedade capitalista mas os bastardos da reação. É assim que
Bernstein passa, com uma lógica rigorosa, da concepção materialista da história
para a do Frankfurter Zeitung ou do Vossische Zeitung.
Depois de ter abjurado de qualquer
critica socialista da sociedade capitalista, contenta-se em considerar
satisfatório o sistema atual, pelo menos no seu conjunto. É um passo que
Bernstein não hesita em dar; considera que na Alemanha de hoje, a reação não é
muito forte: "nos países da Europa Ocidental não se pode falar em reação
política"; pensa que em todos os países do Ocidente a "atitude das
classes burguesas em relação ao movimento socialista é mais ou menos uma
atitude de defesa e não de opressão".
Não existe pauperização, mas uma
melhoria do nível de vida dos operários; a burguesia é politicamente
progressiva e mesmo moralmente sã. Não se pode falar de reação ou de opressão.
Tudo é feito para melhorar o melhor dos mundos... Depois de ter dito o A,
Bernstein é, lógica e consequentemente, levado a recitar todo o alfabeto.
Começou por abandonar o objetivo final do movimento. Mas, como na prática não
pode haver movimento socialista sem finalidade socialista, é obrigado a
renunciar ao próprio movimento.
Toda a doutrina socialista de
Bernstein se desmorona dessa maneira. A orgulhosa e admirável construção
simétrica do sistema marxista é, para ele, um montão de escombros onde os
destroços de todos os sistemas, os fragmentos do pensamento de todos os grandes
e pequenos espíritos encontraram a vala comum. Marx e Proudhon, Leo von Buch e
Frantz Oppenheimer, Friedrich-Albert Lange e Kant, Prokopovitch e o doutor
Ritter von Neupauer, Herkner e Schulze-Gaevernitz, Lassalle e o professor
Julius Wolff: todos contribuíram para o sistema de Bernstein. A cada um foi
buscar o seu bocado. Que tem isto de espantoso? Abandonando a perspectiva de
classe, perdeu todo o ponto de referência marxista; renunciando ao socialismo
científico perdeu o eixo de cristalização intelectual em torno do qual os
factos isolados se agrupavam num conjunto orgânico de uma concepção coerente do
mundo.
Esta doutrina composta por
fragmentos de todos os sistemas possíveis, sem distinção, pode parecer, à
primeira vista, uma abordagem livre de preconceitos. Com efeito, Bernstein não
quer ouvir falar numa "ciência de partido" ou, mais precisamente, de
uma ciência de classe, de um liberalismo de classe ou de uma moral de classe.
Julga representar uma ciência abstrata, universal, humana, um liberalismo
abstrato, uma moral abstrata.
Mas a sociedade real compõe-se de
classes com interesses, aspirações, concepções diametralmente opostas e de uma
ciência humana universal no campo social. Um liberalismo abstrato, uma moral
abstrata, são a consequência da fantasia e da utopia pura. O que Bernstein
julga ser a sua ciência, a sua democracia, a sua moral universal, tão
impregnada de humanismo, é simplesmente a moral da classe dominante, quer
dizer, a ciência, a democracia e a moral burguesas.
Na realidade, negar o sistema
económico marxista e converter-se às doutrinas de Bernstein, Boehm-Jevons, Say,
Julius Wolff, não será trocar a base científica da emancipação da classe
operária pela apologética da burguesia? Evocando o carácter universalmente
humano do liberalismo, degradando o socialismo até o transformar numa
caricatura, Bernstein retira ao socialismo o seu carácter de classe, o seu
conteúdo histórico, em resumo, todo o seu conteúdo; inversamente, faz da
burguesia campeã do liberalismo na história, a representante do interesse
universalmente humano.
Bernstein condena a excessiva importância
atribuída "aos fatores materiais" considerados como forças
todas-poderosas da evolução, guerreia o "desprezo pelo ideal" da
socialdemocracia; institui-se campeão do idealismo, da moral, enquanto,
simultaneamente, se ergue contra a única fonte de conhecimentos morais para o
proletariado, a luta de classes revolucionária; fazendo-o, acaba por pregar
para as classes operárias o que é a quintessência da moral burguesa, a
reconciliação com a ordem estabelecida e a transposição da esperança para a lei
do universo moral. Por fim, reservando os ataques mais violentos contra a
dialética, não estará a visar o modo de pensar específico do proletariado
consciente, lutando pelas suas aspirações? Não será a dialética o instrumento
que deve ajudar o proletariado a sair das trevas onde mergulha o seu futuro
histórico, a arma intelectual que permite ao proletariado, ainda sob o jugo
material da burguesia, triunfar, convencê-la de que está condenada a morrer, a
provar-lhe a certeza infalível da sua vitória? Esta arma não terá desempenhado
a sua obrigação no âmbito do espírito da revolução?
Bernstein, abandonando a dialética,
entrega-se ao jogo intelectual menor das fórmulas equilibristas tais como
"sim, mas", "por um lado, por outro lado", "ainda que,
contudo", "mais ou menos", adopta, logicamente, o modo de pensar
histórico da burguesia decadente, modo de pensar que reflete fielmente a sua
existência social e a sua ação política.
O jogo menor do equilíbrio político
traduzido por fórmulas: "por um lado, por outro lado", "sim,
mas", preciosas para a burguesia atual, encontra o seu fiel reflexo no
modo de pensar de Bernstein; e o modo de pensar de Bernstein é o mais sensível
e seguro sintoma da sua ideologia burguesa. Mas, para Bernstein, o termo
burguês já não designa uma classe; é um conceito social universal.
O que significa simplesmente –
lógico até às suas últimas consequências, até ao último ponto colocado sobre o
último i – que, abandonando a ciência, a política e o modo de pensar do
proletariado, abandona igualmente a linguagem histórica do proletariado pela da
burguesia. Porque por Bürger (burguês e cidadão) Bernstein entende sem
diferenciações, burguês e proletário, homem em geral. É que efetivamente o
homem é para ele o burguês, e a sociedade humana é idêntica à sociedade
burguesa. (De Reforma ou Revolução? 1900)
A Rosa de todas as rosas
PARTIDO OBRERO DA ARGENTINA SE REÚNE COM CONLUTAS E PSTU DO BRASIL
PARTIDO OBRERO DA ARGENTINA SE REÚNE COM CONLUTAS E PSTU DO BRASIL
Rafael Santos
Os deputados Néstor Pitrola e Pablo
Lopez, assim como vários dirigentes do PO reuniram-se no Congresso Nacional da
Argentina com dirigentes da Central Sindical Conlutas e do PSTU do Brasil. Os
companheiros brasileiros foram à Argentina, em um quadro de demissões e
suspensões na indústria automobilística nos dois países, depois de um convite
feito pelo PO em maio passado para começar uma luta comum dos trabalhadores
metalúrgicos. Participaram do encontro, Renato (Conlutas), Vinicius (Sindicato
dos Metalúrgicos de São José dos Campos), Eduardo (delegado sindical da fábrica
General Motors, em São Paulo) e Ricardo e Antônio (dirigentes sindicais e cipeiros).
Pitrola começou a reunião com uma
caracterização da situação do movimento operário e o desenvolvimento da crise
econômica e do governo kirchnerista. Destacou as comissões paritárias, as
grandes greves de professores em Chubut, Buenos Aires e Salta, a greve geral do
dia 10 de abril e o papel protagonista das bancadas parlamentares da Frente de
Esquerda. Depois veio a referência à luta dos demitidos e suspensos, em
Córdoba, na Gestamp e Calsa. Pitrola ressaltou a violenta reação da burocracia
contra a intervenção do ativismo classista e de esquerda e contra o Partido
Obrero e a Frente de Esquerda, incluindo o ataque da presidenta do país contra
o que ela chamou de uma tentativa de "tomar o Palácio de Inverno".
Renato, da Conlutas, depois de
mencionar o conhecimento que existe na esquerda brasileira do grande papel da
Frente de Esquerda na Argentina, relatou a radicalização operária e da
juventude no Brasil desde junho do ano passado - com a mobilização contra o
tarifaço dos transportes. "Lula anunciou que o Mundial seria uma festa no
Brasil, mas chegamos com uma ampla oposição operária e popular, com poderosos
movimentos de luta: metroviários, garis, rodoviários, etc." Propôs
coordenar as lutas e resistências do Brasil e da Argentina e até mesmo em
outros lugares do mundo. Disse, também, da necessidade de se tomar medidas para
formar um "polo operário de resistência a nível mundial".
Junior, do PSTU, indicou que as
patronais usavam a crise para obrigar aos trabalhadores a aceitar o ‘ajuste’.
Assinalou também a necessidade de intervir nas questões políticas: denunciou
que o Brasil, um país com maioria negra e mulata, enviou forças militares (como
a Argentina) para o Haiti, para reprimir suas massas exploradas afro
caribenhas.
Pitrola aderiu à proposta de retirada
imediata das tropas do Haiti. Ressaltou que a crise industrial acabou com
350.000 postos de trabalho no último ano e meio. O problema é como enfrentá-la.
Destacou que seria a oportunidade de convocar a uma Conferência
Latino-americana da esquerda revolucionária e o classismo, a partir do Brasil e
da Argentina, da América Latina, especialmente quando o nacionalismo burguês em
declínio, no contexto de ascensão da esquerda, por um lado, e de uma renovação
das lutas, de outro. Esta proposta já havia sido feita ao Congresso Operário de
Solidariedade que se realizou em Paris, em abril do ano passado. Os dirigentes
da Conlutas se interessaram na proposição e convidaram o PO para o Encontro
Sindical internacional de trabalhadores de fábricas metalúrgicas, em novembro
próximo.
PELA RETIRADA DAS TROPAS ESTRANGEIRAS DO HAITI
Em outubro, o Conselho de Segurança
das Nações Unidas deverá revalidar - ou não - a continuidade das tropas da
MINUSTAH no Haiti. Há dez anos, esta força de ocupação foi implantada no país
caribenho, sob o pretexto de uma missão humanitária e de estabilização, mas
constitui uma intervenção em regra do imperialismo ianque e europeu no país e
na região. Muitas organizações colocaram de pé uma campanha continental pela
retirada definitiva das tropas de ocupação. A história da MINUSTAH no Haiti
inclui a repressão dos protestos populares, o estupro de menores, bem como a
introdução da epidemia de cólera (que matou 8.000 pessoas e afetaram 700 mil outras).
A recente onda de protestos contra o presidente Martelly incluiu a
reivindicação de retirada das forças de ocupação, uma abordagem que tem o apoio
de 90% da população, de acordo com pesquisas. O Senado, inclusive, solicitou
duas vezes a retirada das tropas.
Com o planejamento estratégico dos
Estados Unidos, França e Canadá, o comando das tropas está a cargo do Brasil, e
o contingente é composto por soldados argentinos, bolivianos, uruguaios e
equatorianos, entre outros. Os governos "progressistas" da região,
com exceção da Venezuela, têm assumido o papel de terceirização militar do
imperialismo ianque e francês. Um dos responsáveis por esta situação, o
ministro da Defesa da Argentina, Agustín Rossi, é um dos pré-candidatos do
kirchnerismo para 2015.
Como parte desta campanha
continental, em 9 de junho se realizou uma mobilização no Ministério das
Relações Exteriores da Argentina. Também estão em desenvolvimento atividades no
próprio Haiti, Uruguai e Brasil. Solidariedade com o povo haitiano! Retirada
imediata das tropas e pelo fim da MINUSTAH!
CAMPONESES PARAGUAIOS CONTINUAM PERSEGUIDOS
Há dois anos, uma provocação contra
os sem terra paraguaios concluiu em um confronto que resultou em 17 mortos,
sendo 11 deles camponeses e seis policiais. As consequências do massacre estão
em toda parte. Há muita sequela, crianças ficaram seus os pais, mulheres
perderam os filhos, os maridos e muitos estão sendo processados. Hoje, as
famílias vivem parte na beira da estrada. Até o momento, somente os
trabalhadores rurais foram condenados pelo massacre. No total, 43 pessoas estão
sendo processadas por algum envolvimento na morte dos policiais. As mortes dos
camponeses, ninguém investiga. Os líderes sofrem perseguição, Mariano Castro
perdeu um dos seus filhos no massacre e agora tem dois deles em prisão. O
governo não dá nenhuma ajuda às vítimas. Muitos que vivem em Curuguaty precisam
de auxílio especial. O sistema de saúde não é público. A pergunta sobre o que
aconteceu em Curuguaty segue no Paraguai. Até o momento, não há respostas sobre
os responsáveis pelo massacre e diversas denúncias sustentam que os camponeses
não foram responsáveis pelas mortes dos policiais. Os doze camponeses
investigados pelas mortes estão em prisão domiciliar, com custódia policial e
não podem sair para trabalhar, mas precisam sustentar suas famílias. Dois mil
hectares da terra foram doados em 1967 para a Armada do Paraguai pela empresa Industrial Paraguaya. Em 2004, a terra
foi transferida oficialmente ao Indert. quando o poder executivo, através de um
decreto, declarou o terreno de interesse social, destinado para reforma
agrária. Pouco depois a empresa Campos Morumbi entrou com um pedido de
usucapião – e o pedido foi acatado na justiça local.
Blas Riquelme, empresário paraguaio
do agronegócio sócio de brasileiros, entrou com outro pedido para transformar o
terreno – totalmente desmatado e com plantações de soja – em uma reserva
natural. Este pedido também foi acatado, e o terreno foi registrado como “Reserva
Natural Campos Morumbi”. Agora, as famílias não conseguem que a terra seja
destinada à reforma agrária porque está em uma reserva natural. Mas ali se
planta soja...
MOÇÃO DE REPÚDIO À PRISÃO POLÍTICA E
TORTURA DE MURILO MAGALHÃES, DO C.A DE DIREITO DA PUC–SP E DA ANEL
No dia 9 de junho, o estudante de
direito da PUC – SP, Murilo Magalhães, diretor do Centro Acadêmico do mesmo
curso e representante no Conselho Universitário foi preso pela Polícia Militar
e torturado nas dependências da sede da Secretaria de Segurança Pública de São
Paulo.
Murilo é ativista da Assembleia
Nacional de Estudantes – Livre (ANEL) e participava de um protesto de apoio à
greve dos metroviários de SP e contra a ação truculenta da tropa de Choque na
repressão à essa. Durante o protesto, ele foi imobilizado pelos policiais no
local e levado para uma sala dentro da SSP/SP sob declaração de ordem de
prisão. Nessa sala ele foi obrigado a retirar a roupa e foi espancado pelos
policiais. Enquanto o espancavam exigiram que Murilo delatasse outros ativistas
envolvidos em protestos. Durante isso, Murilo também sofreu ameaças pessoas e à
sua organização política, além de ser repetidamente chamado de “viado”, de
forma homofóbica, buscando desmoralizá-lo pela sua orientação sexual.
Esse ano, em que se completam 50 anos
da ditadura militar, casos como esses são, ainda mais, um escândalo político. É
inadmissível que sejam questionadas as liberdades democráticas de organização e
manifestação de qualquer ativista.
Exigimos a investigação e punição aos
torturadores de Murilo por terem submetido o mesmo, que estava sob sua guarda e
poder, a intenso sofrimento físico e mental como forma de obter informações e
coagir suas ações políticas.
Juan Carlos não abdicou por caçar
elefantes ou por ter uma amante alemã. Estamos assistindo ao naufrágio do pacto
entre o franquismo e os partidos socialista e comunista que deu à luz à chamada
transição espanhola. Não é verdade que a monarquia foi restaurada como garantia
última desse pacto “democrático”. Um livro recente estabelece claramente que
Juan Carlos conspirou para derrubar o primeiro dos primeiros ministros da “transição”,
Adolfo Suárez, e alentou desse modo o golpe que ficou conhecido como tejerazo, quando a 23 de fevereiro de
1982 um tenente coronel manteve como refém, na ponta da pistola, todo o Parlamento
espanhol. O Rei Juan Carlos recuou quando a operação escapou ao controle dos altos
mandos do exército, e também devido à pressão em sentido contrário das
potências da OTAN. Aproveitou, porém, o golpe para armar um segundo pacto, o
Pacto da Moncloa, que transformou à esquerda espanhola e os sindicatos do país em
uma correia de transmissão do Estado pós-franquista.
A decomposição da família real, com
uma filha e um genro às portas da prisão, não esgota a caracterização da situação
do Estado espanhol. Juan Carlos abdicou pouco antes que o fizesse o chefe do
PSOE, Alfredo Rubalcaba, como consequência da derrubada eleitoral do partido nas
eleições europeias; uma liderança regional disse que o PSOE somente subsiste na
Andaluzia. Na corda bamba também está Rajoy, dentro do PP, e inclusive a direção
de Izquierda Unida. Junto ao monarca
dos safaris afunda o sistema político da “transição”. Paralelamente, se desenvolve
um movimento autonomista poderoso na Catalunha e no País Basco. A separação
nacional destes Estados é incompatível com a monarquia. O próximo Rei, Felipe, já
prometeu “a unidade de Espanha”. A abstenção do representante catalão no Parlamento
diante da abdicação provocou uma crise no partido da burguesia catalã, provocada
pelos que reivindicam apenas uma maior autonomia para Catalunha dentro do
Estado espanhol. O esgotamento do sistema político se estende ao interior das
nacionalidades e das autonomias. O teste mais severo é o da decomposição da
economia do Estado centralizado, com um desemprego de 24%, no oitavo ano da crise
mundial, e com uma lista enorme de despejos em poder dos bancos. Não surpreendem
as constantes mobilizações populares pelas razões mais diversas, incluída a demissão
de todo o regime político.
Quais seriam as alternativas? Felipe
pretende fingir que sua função é reinar e não governar, mas não se deve
esquecer que ele é o chefe das forças armadas e, portanto, de todo o aparelho de
repressão. Vai recorrer à burguesia europeia para brecar as aspirações
independentistas de Catalunha, mas essa reivindicação penetrou muito forte na
pequena burguesia e em uma parte dos trabalhadores catalães, pela miragem de
que a separação seria a saída para a crise capitalista. A oposição de esquerda
que emergiu nas últimas eleições é politicamente inconsistente, não manifesta
interesse em atuar como instrumento político da luta de classes dos trabalhadores.
A profundidade e extensão da crise acentuarão a luta popular e a crise
política. A renúncia de Juan Carlos já produziu um movimento pela República, sob
a forma da exigência de um referendo sobre a organização do Estado. As
sondagens indicam uma tendência republicana majoritária na população. Ela traduz
uma aspiração para uma saída popular à crise capitalista.
Se os movimentos nacionais independentistas
se tornarem mais fortes e a luta de classes se aguçar, a crise política poria o
novo rei diante da necessidade de empreender um novo tejerazo com o Rei à cabeça. A monarquia é uma arma da reação, não
uma representação simbólica. As massas, ao contrário, avançarão cada vez mais
com a reivindicação da república, que os intelectuais da moda ridicularizaram
nos últimos anos.
Os revolucionários somos os campeões
da República e do direito à separação (independência) nacional. Mas
acrescentamos: nem uma nem outra podem resolver a crise do capital para que a
paguem os capitalistas. Defendemos, por isso, uma República Socialista e a
unidade dos explorados de todo o Estado espanhol e de Portugal numa Federação
socialista dos povos ibéricos.
AS VALAS COMUNS DA IGREJA CATÓLICA
Silvia Jayo
796 cadáveres de crianças, na maioria
com idade menor a um ano, foram encontrados em uma vala comum perto de um convento
de freiras que abrigava mães solteiras em Tuam, na Irlanda. Elas morreram entre
1925 e 1961, período durante o qual funcionou o convento de Santa Maria. As
freiras as enterraram secretamente. As mortes foram causadas, principalmente,
por tuberculose, infecções, defeitos de nascimento e partos prematuros. O
governo conserva em segredo os certificados de óbito de até 4000 bebês que foram
enterrados em outras fossas, sem identificação durante décadas. Este horror é
coisa do passado? Um informe do bispo de Dublin, de 2009, fez conhecer milhares
de casos de crianças que sofreram “abusos físicos e sexuais, e torturas
psicológicas” perpetradas por sacerdotes católicos entre 1975 e 2004.
O Comité das Nações Unidas contra a
Tortura manifestou estar preocupado por informes de que funcionários católicos
“resistem ao princípio da obrigação de informar” sobre as acusações de abusos.
A máquina de abusar e matar continua funcionando.
Bandeira de Borotba, cisão à esquerda do Komsomol,
Juventude Comunista, na Ucrânia. Representa os líderes do Exército Vermelho na
guerra civil de 1918-1921, incluído Leon Trotsky. A tradição revolucionária
revive no berço da revolução proletária mundial
Tribuna Classista
Conselho de Redação: Carlos Sanches – Rodrigo Belinaso Guimarães –
Guilherme Giordano – Cristiana de Vasconcelos Lopes – David Lucius – Edgar
Azevedo – José Menezes Gomes – Fabio André Pereira – José Alberto Bandeira
Ramos – Michel Goulart Silva – Alfeu Goulart – Antonio Carlos Tarragô Giordano
e-mail: tribunaclassista@hotmail.com
blog: http://tribunaclassista.blogspot.com.br/